O reciclador de idéias
Um vietnamita que hoje fabrica sandálias novas com pneus velho conta o que fez para se adaptar às exigências do mercado sem perder o rumo.
Por Carin Hommonnay Petti
Foi por acaso que Thái Quang Nghiã, de 50 anos, chegou ao Brasil, no final dos anos 70. Depois de uma temporada num campo de trabalhos forçados no Vietnã — punição por seu descontentamento com o governo comunista —, ele escapou do país no porão de um barco pesqueiro junto com outros 66 fugitivos. Resgatado em alto-mar por um navio da Petrobras, foi parar no Rio de Janeiro, em pleno carnaval, sem falar uma palavra de português. Hoje ele é dono do grupo Domini, que detém a marca Goóc, de sandálias de pneu reciclado, o carro-chefe da empresa, e de bolsas de lona de caminhão usada. Com faturamento de R$ 50 milhões no ano passado, a empresa tem 280 funcionários, duas fábricas em São Paulo e outra em Feira de Santana, na Bahia. Na carteira de clientes, gigantes do porte da C&A, Avon e Galeries Lafayette, a maior loja de departamentos da França. Desta vez, porém, seus feitos não vieram do acaso. Boa parte do sucesso do vietnamita é resultado de sua disposição de mudar estratégias e procurar outros canais de venda quantas vezes forem necessárias para se adaptar a diferentes cenários e fisgar novas oportunidades.

Foto: Daniela Toviansky
Seu jogo de cintura não vem de hoje. Nghiã começou a vida de empresário em 1986, depois de receber 400 bolsas como pagamento de uma dívida. Decidiu vendê-las para recuperar pelo menos parte do prejuízo. Inexperiente, cogitou, a exemplo de grande parte dos outros pequenos fabricantes do ramo, desovar a mercadoria entre atacadistas da rua 25 de Março, tradicional centro do comércio popular paulistano. Mas, em busca de menos concorrência e preços melhores, acabou optando pela venda de loja em loja na Grande São Paulo. Houve quem estranhasse a presença daquele homem de olhos puxados e sotaque carregado. “Alguns comerciantes pensavam que eu vendia mercadoria roubada para a máfia chinesa”, diz. Ainda assim, venceu a desconfiança e se desfez de todo o estoque.
Animado com os resultados, decidiu apostar na produção própria. Ele mesmo se encarregava de cortar e estampar as peças em casa e depois levá-las às oficinas que fariam a costura. Por pouco a iniciativa não lhe custou o casamento. Ele conta que sua mulher, inconformada com o cheiro de tinta no apartamento, foi passar uma temporada na casa da sogra, com a filha recém-nascida a tiracolo. Apesar da represália, Nghiã persistiu. Dois anos depois, com o aumento da produção, já tinha custos magros o suficiente para garantir bons negócios com vendedores atacadistas. Foi o que faltava para que ele pudesse vender seus produtos na mesma 25 de Março que havia rejeitado antes.
De lá para cá, voltou a trocar inúmeras vezes de público-alvo. Em diferentes fases, apostou em lojas próprias, atacadistas de cidades de norte a sul do país, empresas de catálogos e no mercado de brindes de empresas. E por que tanta mudança?“Preciso estar sempre atento a novas oportunidades”, afirma. “No mundo de hoje não é o grande que engole o pequeno, é o rápido que engole o devagar”. A frase pode até ser batida, mas não é infundada.“ Os bons empreendedores correm atrás de nichos e oportunidades”, diz o consultor Tales Andreassi, professor do Centro de Empreendedorismo e Novos Negócios da Fundação Getulio Vargas. O coordenador do Centro de Empreendedorismo do Ibmec-São Paulo, Marcos Hashimoto, pensa da mesma forma. “É importante revisar sempre todos os aspectos do negócio, incluindo produtos e canais de venda”, afirma.
Persistente esse vietnamita... um exemplo para todos nós!
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